Karoline Vitto, que j&aacute; usava estruturas met&aacute;licas nas suas pe&ccedil;as, abra&ccedil;ou a cria&ccedil;&atilde;o de Carlos Penna numa collab-fus&atilde;o de roupa-joia

Karoline Vitto e Carlos Penna s&atilde;o dois criadores de moda que v&ecirc;m desafiando o &oacute;bvio nos seus campos de trabalho em caminhos que corriam paralelamente. At&eacute; agora. Ela, radicada em Londres, tem brilhado com roupas escult&oacute;ricas poss&iacute;veis que abra&ccedil;am diferentes corpos com conforto. Ele, designer de <a href="https://www.revistalofficiel.com.br/moda/editorial-de-moda-o-poder-dos-acessorios">acess&oacute;rios</a> mais importante do momento no Brasil, tem feito o mercado nacional rever suas estruturas criativas. Ela traz sua marca para c&aacute; em 2025. Ele abre um plano de expans&atilde;o internacional depois de marcar presen&ccedil;a em desfiles ao redor do mundo. Na &uacute;ltima temporada de <a href="https://www.revistalofficiel.com.br/gastronomia/londres-10-restaurantes-imperdiveis">Londres</a>, o meio do caminho que uniu ambos veio &agrave; tona: Vitto, que j&aacute; usava estruturas met&aacute;licas nas suas pe&ccedil;as, abra&ccedil;ou a cria&ccedil;&atilde;o de Penna numa collab-fus&atilde;o. Um encontro quase inevit&aacute;vel, que remexe a ideia de roupa que &eacute; joia que &eacute; <a href="https://www.revistalofficiel.com.br/joias/joias-saiba-quais-sao-as-tendencias-de-joias-para-o-outono-24">roupa-joia</a>.&nbsp;

L&rsquo;OFFICIEL Karol, voc&ecirc; usa metal como parte da sua roupa desde que surgiu. De onde veio essa hist&oacute;ria?&nbsp;
KAROLINE VITTO Acho que nunca contei isso antes em entrevistas&hellip; mas eu fazia dan&ccedil;a do ventre na adolesc&ecirc;ncia. Sempre fui muito acostumada com a ornamenta&ccedil;&atilde;o da roupa, o metal e seu barulho. Cresci com isso. Acho que vem um pouco da&iacute;, se olharmos para o passado. Quando a marca come&ccedil;ou a se firmar de verdade, o meu design sempre teve um aspecto ornamental &ndash; mas, tamb&eacute;m, clean. Acho que o metal trouxe muito isso, essa fus&atilde;o da forma com o barulho, com o peso da pe&ccedil;a. E &eacute; algo que me possibilitava uma pureza de formas, ao mesmo tempo. At&eacute; de maneira meio contradit&oacute;ria, que n&atilde;o &eacute; clean, mas tamb&eacute;m n&atilde;o &eacute; megadecorada. Quando a marca apareceu, come&ccedil;amos a usar esse metal no sentido decorat&oacute;rio &ndash; uma forma de isolar uma parte do corpo e dar destaque a ela, como se trabalh&aacute;ssemos com uma joia. Como voc&ecirc; faria com um brinco, por exemplo, para chamar aten&ccedil;&atilde;o para o pesco&ccedil;o: vamos decorar essa &aacute;rea para trazer o olhar. No cerne, o objetivo era criar essa moldura. Depois veio o sentido pr&aacute;tico da jun&ccedil;&atilde;o do metal com a malha, que possibilita um aspecto t&aacute;til e 3D que n&atilde;o se consegue trabalhando com o tecido puro. Ele cria um aspecto escultural de que gosto muito. E eleva a malha, um tecido que muitas vezes &eacute; considerado simples, para um palco muito maior.

L&rsquo;O Como foi o processo para resolver essa jun&ccedil;&atilde;o da malha com o metal?&nbsp;
KV Levou um tempo at&eacute; resolver tudo de um jeito bonito. Antes de existir como marca, foi uma das primeiras coisas que comecei a pensar, esses acabamentos. At&eacute; chegar a este momento, tendo desenvolvido todos os recursos necess&aacute;rios&hellip; Hoje, muitos dos t&uacute;neis, dos canais, dos drapeados que usamos nas pe&ccedil;as, h&aacute; um arquivo de solu&ccedil;&otilde;es, nossos c&oacute;digos pr&oacute;prios. Imagino que como foi para o Carlos, de entender essas ergonomias dos acess&oacute;rios, as ligas met&aacute;licas diferentes e as possibilidades que elas abrem.&nbsp;

L&rsquo;O Carlos, do seu lado: como voc&ecirc; chegou a esse jeito de trabalhar, com um caminho est&eacute;tico t&atilde;o forte e com foco no material?&nbsp;
CARLOS PENNA Eu nunca acreditei muito na rigidez total do metal. Acho que a primeira coisa que vem, desde sempre, &eacute; a busca de novas ligas e novas hist&oacute;rias que possibilitem a ideia do material que se consegue manusear. A maioria das mat&eacute;rias-primas que uso hoje n&atilde;o &eacute; das tradicionais do mercado de acess&oacute;rios. Fazemos uma pesquisa, de coisas industriais ou mundanas, para chegar ao que apresentamos. E tem muito disso do escult&oacute;rico, de quem usa poder interferir na forma. H&aacute; uma busca atr&aacute;s dessa mat&eacute;ria n&atilde;o r&iacute;gida, no trabalho todo, desde o in&iacute;cio da marca. A nossa primeira cole&ccedil;&atilde;o se chamava Muta&ccedil;&atilde;o &ndash; era poss&iacute;vel mexer, manusear tudo. Sempre me interessei pela possibilidade de as pe&ccedil;as se transformarem. E carrego isso at&eacute; hoje. Em toda cole&ccedil;&atilde;o, pelo menos uma parte &eacute; male&aacute;vel, ajust&aacute;vel. Se n&atilde;o tem, as clientes at&eacute; estranham.

L&rsquo;O Quando cita esses materiais n&atilde;o tradicionais, fala apenas sobre o metal?&nbsp;
CP N&atilde;o, em tudo. Temos uma pesquisa realmente industrial, a maioria das mat&eacute;rias-primas tem outras origens. A nossa borracha vem de processos automotivos. E, no metal, n&atilde;o usamos os convencionais do setor. N&atilde;o &eacute; s&oacute; o lat&atilde;o, por exemplo. Tanto que os nossos brincos, mesmo grandes, s&atilde;o muito leves. Mesmo o nosso cobre n&atilde;o &eacute; o cobre comum, esperado &ndash; &eacute; mais male&aacute;vel, tem durabilidade muito maior. &Eacute; um estudo imenso de d&eacute;cada, at&eacute; chegar a essas solu&ccedil;&otilde;es.

L&rsquo;O Em que momento aconteceu esse match, finalmente?&nbsp;
KV Eu j&aacute; conhecia a marca do Carlos, j&aacute; tinha ido &agrave; loja, mas n&atilde;o tinha colocado, na pr&aacute;tica, junto com a minha roupa. Ent&atilde;o foi no come&ccedil;o de 2024, quando estava no Brasil para gravar o v&iacute;deo que mandamos para o LVMH Prize e usamos pe&ccedil;as do Carlos para complementar os looks. Nesse momento, o casamento das roupas com os acess&oacute;rios&hellip; foi um casamento perfeito. O desenho do metal e as linhas refletiam similaridades, era parecido com os nossos recortes, as curvas. Ent&atilde;o era mais do que natural, precis&aacute;vamos fazer algo juntos. N&oacute;s nos falamos, come&ccedil;amos a trocar ideias virtualmente. Em mar&ccedil;o, fizemos uma imers&atilde;o em S&atilde;o Paulo &ndash; Carlos apresentou diversas op&ccedil;&otilde;es de metais, acess&oacute;rios, fios. Pegamos um manequim e ficamos ali, exercitando.&nbsp;
CP O processo dos dois &eacute; extremamente t&aacute;til. Ent&atilde;o era preciso esse encontro para ver as possibilidades, as malhas, era algo que ambos tinham que estar juntos. Com Karol foi a primeira vez que tive uma troca criativa em uma escala interessante. Foi uma collab real, um entendendo as t&eacute;cnicas criativas do outro, um estudo intenso, evoluindo ideias. Eu mesmo nunca tinha trabalhado com pe&ccedil;as cromadas, que t&ecirc;m uma durabilidade maior do que um banho normal &ndash; &eacute; algo que n&atilde;o se v&ecirc; em joias, mas em torneiras.&nbsp;
KV Acho que esse &eacute; o legal do processo. Muito do que fa&ccedil;o na marca vem de uma coisa bem industrial. Como olhar a fabrica&ccedil;&atilde;o de uma mola para entender como s&atilde;o feitas certas coisas. E uma f&aacute;brica de molas, convenhamos&hellip; n&atilde;o tem nada a ver com vestu&aacute;rio. Passamos por um lado meio brutalista da hist&oacute;ria.&nbsp;
CP &Eacute; muito sobre essa pesquisa, mesmo. N&atilde;o &eacute; f&aacute;cil colocar metal numa malha. Olhando o resultado, at&eacute; pode parecer algo trivial &ndash; mas n&atilde;o &eacute; uma jun&ccedil;&atilde;o f&aacute;cil. Pede um cuidado gigantesco porque a malha pode rasgar; se colocar uma densidade maior, o metal puxa e distorce tudo.&nbsp;

L&rsquo;O De onde vinha o seu metal antes, Karol?&nbsp;
KV Trabalhava com uma designer de Londres, que fazia tudo manualmente &ndash; at&eacute; que sofreu um acidente e n&atilde;o p&ocirc;de mais. Depois, comecei a trabalhar com essa f&aacute;brica de molas que topou entrar na hist&oacute;ria. Mas &eacute; como Carlos falou, o processo t&aacute;til faz toda a diferen&ccedil;a. Assim como as minhas modelagens de malha e as pe&ccedil;as dele, &agrave;s vezes voc&ecirc; v&ecirc; aquelas formas e tudo vira um ponto de interroga&ccedil;&atilde;o &ndash; at&eacute; enxerg&aacute;-las encaixadas no corpo. Temos muito disso em comum, essa ideia de pensar na ergonomia final.&nbsp;
CP Se voc&ecirc; observar, &agrave;s vezes nada parece fazer sentido. &Eacute; muito sobre um pensamento de forma e fun&ccedil;&atilde;o. N&oacute;s nos encontramos tr&ecirc;s dias ao vivo e foi interessant&iacute;ssimo, pois ela j&aacute; sabia como fazer, j&aacute; puxava o metal junto com a malha. Esse processo durou at&eacute; o dia do desfile &ndash; um dos looks foi refeito logo antes, na pr&aacute;tica. &Eacute; sempre assim, pensar at&eacute; resolver. E, ao chegar ao fim, ver que n&atilde;o &eacute; s&oacute; fun&ccedil;&atilde;o, mas carrega uma quest&atilde;o est&eacute;tica. Fa&ccedil;o muitas collabs, trabalho com muitas marcas, mas s&atilde;o poucas com quem realmente divido processos. Isso &eacute; legal, pois muda tudo na cria&ccedil;&atilde;o, vira um trabalho que &eacute; fundido &ndash; t&atilde;o meu quanto dela, &eacute; dos dois. N&atilde;o d&aacute; para separar, apontar quem &eacute; mais importante. &Eacute; uma troca total.

L&rsquo;O Carlos, para voc&ecirc;, estar no processo da constru&ccedil;&atilde;o da roupa, de fato, foi uma novidade completa?&nbsp;
CP Foi. Todos os metais que tinha feito para roupas, antes, precisavam se encaixar em ideias j&aacute; estabelecidas. Ou na marca pr&oacute;pria de vestu&aacute;rio que tive, a P.O.R., a presen&ccedil;a do metal era muito pontual. Eu me envolver na constru&ccedil;&atilde;o, entender de fato onde e como coloc&aacute;-los, foi a primeira vez. N&atilde;o era algo apenas decorativo.&nbsp;
KV Isso diferencia muito. N&atilde;o &eacute; como um broche, que se coloca para enfeitar. Ali, se o metal n&atilde;o funcionasse, a roupa literalmente cairia &ndash; ele &eacute; essencial.&nbsp;
CP Conversamos muito online para ajustarmos necessidades. E sempre nesse pensamento novo, para mim, de que os metais fazem parte da constru&ccedil;&atilde;o. A grande diferen&ccedil;a &eacute; que n&atilde;o foi uma encomenda, foi uma troca de olhares. Karol, assim como eu, mas nos processos dela, j&aacute; sabe lidar com o metal. Trabalhar com uma mistura de materiais &eacute; sempre dif&iacute;cil. Se fosse com outra pessoa, provavelmente n&atilde;o ficaria t&atilde;o bom o resultado.&nbsp;
KV Fico pensando se, em vez de tr&ecirc;s dias, tiv&eacute;ssemos duas semanas com os dois trabalhando juntos ao vivo, se as duas estruturas estivessem no mesmo lugar, o que poderia ter sido realizado.&nbsp;
CP &Eacute;&hellip; &eacute; um processo muito manual, n&atilde;o adianta. Foi uma experi&ecirc;ncia &oacute;tima, esses dias que tivemos juntos aqui e os dias antes do desfile, em Londres &ndash; que mudamos muita coisa. Al&eacute;m do resultado est&eacute;tico, era ver a constru&ccedil;&atilde;o acontecendo e entendendo onde poder&iacute;amos refinar.

L&rsquo;O Essa adapta&ccedil;&atilde;o aconteceu do seu lado tamb&eacute;m, n&atilde;o &eacute;, Karol? Mas de uma forma mais libert&aacute;ria, sem precisar lidar com uma f&aacute;brica de molas.
KV Exato! N&atilde;o estava mais conversando com o John Smith, me dizendo o que dava ou n&atilde;o dava para fazer por e-mail. Foi maravilhoso encontrar algu&eacute;m com uma cabe&ccedil;a parecida com a minha para criar junto. Que, como eu, trabalha muito com o material, n&atilde;o &eacute; tanto do desenho e gosta de experimentar em tr&ecirc;s dimens&otilde;es. Isso abre outros horizontes. S&oacute; de o metal ser male&aacute;vel, poder ser ajustado, para a hist&oacute;ria das roupas &ndash; e a nossa hist&oacute;ria de adapt&aacute;-las para diferentes formatos de corpo &ndash; foi um match muito bom. Est&aacute; sendo.&nbsp;
CP Foi um processo de adapta&ccedil;&atilde;o. Uma semana antes do desfile, quando nos reencontramos ao vivo e tudo come&ccedil;ou a tomar forma de verdade, apareceram v&aacute;rias ideias novas que v&atilde;o ser exercitadas na pr&oacute;xima collab. Era tudo novo. Foi a primeira vez que deixei os acess&oacute;rios de corpo, brincos e pulseiras e afins, para serem criados por &uacute;ltimo, pois eles precisavam fazer sentido na hist&oacute;ria toda.

L&rsquo;O Karol, voc&ecirc; est&aacute; abrindo caminho para uma fase nova de marca, certo?&nbsp;
KV Sim, especialmente com essa movimenta&ccedil;&atilde;o de trazer o nosso trabalho para o Brasil. Era um desejo de tempos, e acabamos fazendo o caminho inverso: em vez de come&ccedil;ar a marca aqui e internacionalizar, comecei em Londres e agora estou nacionalizando. Estamos focadas em utilizar processos e trabalhar de maneira um pouco mais industrial, o que est&aacute; bem interessante. Nosso processo, l&aacute;, sempre foi muito artesanal &ndash; o que &eacute; lindo, mas tem seus limites. O trabalho de ateli&ecirc; &eacute; muito mais demorado e mais custoso e exige muito do contato com a pessoa que vai vestir, complicando atender algu&eacute;m no Brasil ou em qualquer outro lugar. O objetivo &eacute; trazer a nossa moda para um lugar em que as pessoas consigam experienciar e viver nessas roupas. Desde mar&ccedil;o come&ccedil;amos esse processo longo de traduzir a marca para a realidade daqui. Achar correspondentes para a malha italiana que uso l&aacute;, que tivessem um caimento parecido ou at&eacute; melhor. Encontramos fornecedores com propostas sustent&aacute;veis, o que &eacute; muito bom. O nosso jeans tem 75% menos &aacute;gua na produ&ccedil;&atilde;o, a malha tem um processo de dry cleaning, com um tingimento que &eacute; muito mais circular. S&atilde;o agendas que queria cumprir e s&atilde;o um pouco mais dif&iacute;ceis de alcan&ccedil;ar l&aacute; fora. E agora temos a nossa manufatura aqui, com a primeira cole&ccedil;&atilde;o que chega oficialmente em mar&ccedil;o. &Eacute; interessante, pois criamos um processo totalmente industrial, mas feito por uma f&aacute;brica que &eacute; superfamiliar. Fizemos essa ponte de trazer para o Brasil algo que era feito em ateli&ecirc;, de forma pequena, numa empresa que mant&eacute;m uma cara de algo feito de maneira cuidadosa.

L&rsquo;O &Eacute; a mesma cole&ccedil;&atilde;o?&nbsp;
KV Tem de tudo um pouco. Trouxemos alguns best-sellers e algumas pe&ccedil;as que reimaginamos para o mercado brasileiro, al&eacute;m de propostas novas. Trabalhamos com uma variedade de momentos, para o dia e para a noite, com tecidos de pesos diferentes. Tem esse foco, digamos, mais comercial &ndash; com que n&atilde;o precisava me preocupar tanto quando trabalhava numa viv&ecirc;ncia de ateli&ecirc;, da passarela, do sob medida. &Eacute; para que as pessoas consigam consumir o universo Karoline Vitto, mas de uma maneira bem vida real para o mercado brasileiro.
L&rsquo;O Esse &uacute;ltimo desfile em Londres tamb&eacute;m alcan&ccedil;ou um buzz diferente, n&atilde;o? Depois de ser indicada ao LVMH Prize e tudo o que aconteceu.&nbsp;
KV &Eacute; dif&iacute;cil de mensurar, estando dentro da hist&oacute;ria. Mas imagino que sim. 2024 est&aacute; sendo um ano em que as coisas come&ccedil;aram a borbulhar dentro da marca. Desde setembro de 2023, na verdade, quando apresentamos a cole&ccedil;&atilde;o com a Dolce &amp; Gabbana. A&iacute; rolou o Latin America Fashion Awards, em novembro &ndash; que ganhei e foi incr&iacute;vel. O melhor foi conhecer tantas pessoas, me conectar com os criativos brasileiros que s&oacute; conhecia pelo Instagram. Em fevereiro passado, demos uma pausa quando a marca foi para o LVHM Prize &ndash; que tamb&eacute;m foi uma superoportunidade de nos conectarmos com outras marcas, abrirmos pontes para outros processos. Esse &uacute;ltimo desfile teve um grande apoio da imprensa, foi um momento muito especial. Agora estamos caminhando para um lugar em que, felizmente, o trabalho est&aacute; mais reconhecido. &Eacute; o momento de traz&ecirc;-lo para c&aacute;.&nbsp;

L&rsquo;O Dentro desse processo, voc&ecirc; tem sido colocada automaticamente na caixinha da inclusividade, sobre a roupa que veste corpos diferentes, a marca que coloca modelos fora do padr&atilde;o na passarela. Sempre que falam sobre seu trabalho, o discurso parece inevit&aacute;vel. Isso incomoda voc&ecirc;?&nbsp;
KV Sim. E muito. Pois o trabalho &eacute; sobre tanto al&eacute;m. Quando come&ccedil;amos a marca, esse assunto ainda era muito pouco explorado na pr&aacute;tica. Ainda hoje, h&aacute; poucas marcas que realmente trabalham com inclus&atilde;o de tamanhos &ndash; e sabemos que, a cada esta&ccedil;&atilde;o, os n&uacute;meros nas passarelas ficam mais alarmantes. Mas todas essas marcas, que trabalham com inclus&atilde;o ou que carregam esse t&oacute;pico de maneira forte&hellip; todos estamos cansados de que esse discurso ainda seja t&atilde;o necess&aacute;rio. &Oacute;bvio que s&oacute; posso falar por mim, mas a ideia &eacute; que a roupa sirva a um indiv&iacute;duo, que vem em v&aacute;rios tamanhos e formas. Como o Carlos, que tem as suas pe&ccedil;as para servir ao corpo. Fa&ccedil;o roupas para pessoas, que ficam boas em diversos corpos, tamanhos e idades diferentes. Ela funciona. O que me incomoda &eacute; ser usada para dar um checklist num assunto e pronto. Nesse &uacute;ltimo desfile, tivemos a collab com o Carlos &ndash; que era o maior ponto da cole&ccedil;&atilde;o. Mas tamb&eacute;m trabalhamos com tecidos feitos &agrave; base de algas marinhas, num processo supermanual e precioso. Fiz uma collab de sapatos com a Tabitha Ringwood, uma designer inglesa. Eram tantos assuntos, que foram contados e ningu&eacute;m falou sobre. Continuo sendo colocada no b&aacute;sico. E isso incomoda.

L&rsquo;O Sente que isso atrapalha o crescimento do seu trabalho?&nbsp;
KV Acho que sim, tanto que &eacute; um assunto do qual j&aacute; evitamos falar tanto. As pessoas j&aacute; sabem que, se for &agrave; Karoline Vitto, vai encontrar tamanhos muito al&eacute;m do P/M/G, que nossa grade &eacute; maior, nosso corte &eacute; maior. Esse assunto j&aacute; est&aacute; no DNA da marca. Em um contexto internacional, se voc&ecirc; chegar a um lojista falando que tem uma grade extensa, a resposta ser&aacute;: &ldquo;E da&iacute;?&rdquo;. Ele est&aacute; mais interessado &eacute; em ver uma roupa que venda para seus clientes. No fim das contas, ser colocada eternamente nessa caixinha atrapalha o crescimento da marca em alguns aspectos, pois muita gente ainda tem essa barreira. Especialmente em Paris, o lugar em que mais sinto esse bloqueio das lojas e da imprensa. Ent&atilde;o vale muito mais a pena mudar de assunto, mostrar o design, a proposta, os materiais. No Brasil, tenho sentido a conversa diferente: as lojas sabem que t&ecirc;m a demanda por tamanhos maiores e que precisam deles. L&aacute; fora, h&aacute; o interesse da imprensa, mas as lojas ainda t&ecirc;m resist&ecirc;ncia. Por isso digo que essa classifica&ccedil;&atilde;o prejudica o potencial de crescimento, a entrada em certas lojas. Pois a hist&oacute;ria da inclusividade chega antes da cria&ccedil;&atilde;o.

L&rsquo;O Carlos, voc&ecirc; tamb&eacute;m est&aacute; numa nova fase, em v&aacute;rias camadas. N&atilde;o s&oacute; por ser um criador brasileiro que desfilou em praticamente todas as grandes Fashion Weeks, em apenas uma temporada, mas voc&ecirc; tem posto em pauta o peso do design de acess&oacute;rios dentro da moda. Como est&aacute; essa discuss&atilde;o?&nbsp;
CP Desde o in&iacute;cio da marca, dez anos atr&aacute;s, o crescimento foi muito org&acirc;nico. E bate um pouco no mesmo ponto que Karol disse, de ser colocado em defini&ccedil;&otilde;es. No come&ccedil;o, eu era considerado minimalista &ndash; agora, sou maximalista. E s&oacute;. &Eacute; muito sobre como se &eacute; encaixotado. O meu tra&ccedil;o &eacute; o mesmo, ainda que evolu&iacute;do. Mas vamos crescendo e adquirindo maturidade e, nos &uacute;ltimos anos, me veio essa quest&atilde;o de como as pessoas encaram e encaixam a hist&oacute;ria dos acess&oacute;rios: eles n&atilde;o podem ser relegados a um segundo plano. Cria&ccedil;&atilde;o de acess&oacute;rios &eacute; tamb&eacute;m moda, n&atilde;o pode haver uma separa&ccedil;&atilde;o. Pense em um desfile: a imagem n&atilde;o &eacute; s&oacute; o vestu&aacute;rio. Os sapatos e as bolsas, os brincos, as pulseiras, enfim, s&atilde;o essenciais. Muito se p&otilde;e como o vestu&aacute;rio &eacute; o lugar de excel&ecirc;ncia principal e o resto, mero ornamento. Quanto mais a marca vai crescendo, mais tenho querido deixar bem claro que estamos indo para um pensamento mais amplo. N&atilde;o &eacute; que estou deixando de ser um designer de acess&oacute;rios, mas que consigo ir a outros lugares que tamb&eacute;m s&atilde;o moda e, em paralelo, como isso tem que ser visto. A Carlos Penna participou de 18 desfiles em 2024. Al&eacute;m da SPFW, estivemos presentes em Nova York, Mil&atilde;o, Paris, Londres e Copenhague. Praticamente todas as principais semanas de moda. E n&atilde;o como meras inser&ccedil;&otilde;es comerciais, que seria o caminho mais f&aacute;cil. Constru&iacute;mos narrativas &uacute;nicas com todas as marcas de vestu&aacute;rio com quem desfilamos. O acess&oacute;rio sempre tem uma jun&ccedil;&atilde;o total com a roupa. Da&iacute; culmina no trabalho que fizemos com Karol: &eacute; moda, &eacute; roupa, &eacute; joia. &Eacute; tudo junto. Eu j&aacute; vinha fazendo experimenta&ccedil;&otilde;es que carregam linguagem de roupa. O que ela faz, j&aacute; &eacute; uma roupa-acess&oacute;rio &ndash; e n&atilde;o s&oacute; pelo metal. Essa separa&ccedil;&atilde;o n&atilde;o faz mais sentido.

L&rsquo;O Essa resist&ecirc;ncia, colocando os acess&oacute;rios como algo menor, sente que &eacute; da ind&uacute;stria ou do consumidor?&nbsp;
CP Acho que &eacute; mais da ind&uacute;stria e da imprensa do que do consumidor. E estou falando sobre o mercado brasileiro especificamente, pois em outros lugares j&aacute; h&aacute; um entendimenmais maduro sobre o design de acess&oacute;rios. Podemos pegar a cobertura sobre a nossa collab, por exemplo: essa hist&oacute;ria estava bem clara, divulgada de forma muito correta, e boa parte da imprensa nem se preocupou com o assunto. N&atilde;o falo sobre uma quest&atilde;o de ego, de verdade, mas sobre a cadeia da ind&uacute;stria toda. Quem assina o desfile &eacute; o vestu&aacute;rio, mas quem fez as joias? Quem criou os sapatos? &Eacute; uma quest&atilde;o de respeito em rela&ccedil;&atilde;o a uma hist&oacute;ria criada coletivamente. Al&eacute;m do designer de vestu&aacute;rio, frequentemente os outros criadores envolvidos s&atilde;o invis&iacute;veis. &Eacute; toda uma cadeia jogada para um canto. &Eacute; preciso bater nessa tecla. Em compara&ccedil;&atilde;o, acho que o consumidor final est&aacute; muito mais ligado e pr&oacute;ximo de uma realidade de aten&ccedil;&atilde;o e respeito. Tenho muitas e muitas clientes que j&aacute; entenderam esse peso, que vibram pela nossa hist&oacute;ria. Tem muita gente que acompanha os desfiles e, digo a voc&ecirc;, nem est&aacute; interessada na roupa &ndash; quer ver as ideias que se prop&otilde;e nessas outras &ldquo;cria&ccedil;&otilde;es menores&rdquo;.

&ldquo;SOU MUITO DA forma. PARA CHEGAR A UMA QUE SEJA funcional, &Eacute; PRECISO PURIFICAR O MATERIAL E CHEGAR A UMA BASE QUE SEJA simples &ndash; PARA, ENT&Atilde;O, construir EM CIMA. (...) SEMPRE COME&Ccedil;O PELO material MAIS SIMPLES, PARA TER ESSE ESPA&Ccedil;O DE experimenta&ccedil;&atilde;o. (...) ACONTECE DE TERMOS UM MATERIAL MAIS luxuoso &Agrave; DISPOSI&Ccedil;&Atilde;O QUE n&atilde;o FICARIA T&Atilde;O BONITO DENTRO DA PROPOSTA.&rdquo; 
KAROLINE VITTO

L&rsquo;O Olhando para a hist&oacute;ria de ambos, voc&ecirc;s t&ecirc;m esta discuss&atilde;o em comum: usar materiais triviais, tidos at&eacute; como ordin&aacute;rios, e dar a eles um peso maior por meio do design. Como enxergam esse processo?&nbsp;
KV Eu sou muito da forma. Para chegar a uma que seja funcional, &eacute; preciso purificar o material e chegar a uma base que seja simples &ndash; para, ent&atilde;o, construir em cima. Claro, h&aacute; momentos que pedem um tecido que tem mais peso, entendido como mais especial no imagin&aacute;rio popular em rela&ccedil;&atilde;o &agrave; malha. Mas sempre come&ccedil;o pelo material mais simples, para ter esse espa&ccedil;o de experimenta&ccedil;&atilde;o. E muitas vezes acontece de termos um material mais luxuoso &agrave; disposi&ccedil;&atilde;o que n&atilde;o ficaria t&atilde;o bonito dentro da proposta. Muito por isso que trabalho com a viscose, que j&aacute; chegou em um ponto que tem o peso e o caimento de uma seda, por exemplo, mas &eacute; um tecido vegetal com que, hoje, diversos fornecedores j&aacute; trabalham de maneira circular e sustent&aacute;vel. Ela tem esse lugar do &ldquo;tecido popular&rdquo;, ligado a um dia a dia, que pode ser elevado a outro patamar na constru&ccedil;&atilde;o da roupa. Sempre volto &agrave; viscose, que d&aacute; esse aspecto de ter sido colocada no manequim, drapeada, e continua bonita &ndash; parecendo que at&eacute; sem esfor&ccedil;o.&nbsp;
CP Desde o in&iacute;cio da carreira, sempre trabalhei com objetos ordin&aacute;rios. O brinco feito com um prego foi a primeira pe&ccedil;a da vida. Mas &eacute; engra&ccedil;ado pois, hoje, vejo tudo de forma diferente. N&atilde;o classifico materiais como nobres ou ordin&aacute;rios, apenas como materiais &ndash; a forma que voc&ecirc; vai us&aacute;-los &eacute; que dar&aacute; o valor, por meio do design. Depende muito do que se quer propor; e isso vai muito al&eacute;m do valor financeiro. Cada material tem a sua fun&ccedil;&atilde;o. A prata &eacute; boa para uma coisa, mas p&eacute;ssima para tantas outras que o lat&atilde;o resolve melhor. O ouro &eacute; bom&hellip; at&eacute; certo ponto. Para o meu trabalho, para o que acredito, ele n&atilde;o d&aacute; a maleabilidade de que preciso. Ent&atilde;o prefiro usar materiais que me d&atilde;o a capacidade de desenvolver o meu trabalho.&nbsp;
KV Exatamente isso. Essa hist&oacute;ria do luxo, do cuidado com a longevidade das pe&ccedil;as, o valor que vejo em rela&ccedil;&atilde;o &agrave; mat&eacute;ria-prima: &eacute; muito mais sobre a tecnologia desenvolvida em cima e o que ela me traz. No Brasil, temos malhas desenvolvidas para aspectos e finalidades diferentes. Trabalhamos com uma que &eacute; fina e transparente, pensada para roupas mais leves, sendo usada num vestido de luxo. Vai al&eacute;m do valor monet&aacute;rio, depende muito de como voc&ecirc; trabalha.&nbsp;
CP N&atilde;o adianta ter um acess&oacute;rio de ouro ou uma roupa de seda se n&atilde;o h&aacute; design. Isso &eacute; luxo? N&atilde;o &eacute;. N&atilde;o se pode partir da ideia de que algo &eacute; caro e necessariamente bem resolvido, colocar o material antes do design. Tanto no trabalho da Karol quanto no meu e na nossa collab, a base &eacute; esta: saber manipular a mat&eacute;ria-prima para que ela funcione de uma forma impactante.

L&rsquo;O Essa parceria vai continuar?&nbsp;
CP Sim. A ideia &eacute; trazer as joias que fizemos, agora no come&ccedil;o do ano. Depois, v&ecirc;m as roupas de fato. Mas a conversa n&atilde;o parou no desfile &ndash; pelo contr&aacute;rio, ali fomos anotando ideias que abrem outros caminhos de amadurecimento, v&aacute;rios &ldquo;e se?&rdquo;. A pr&oacute;pria palavra &ldquo;collab&rdquo; j&aacute; ficou t&atilde;o banalizada, mas &eacute; isto: &eacute; uma troca n&atilde;o s&oacute; de marcas, comercialmente falando, mas de duas pessoas que se encontraram para construir algo juntas.&nbsp;
KV E faremos outra hist&oacute;ria em fevereiro, novamente na London Fashion Week. Ainda n&atilde;o decidimos o formato, mas essa troca dessa collab definitivamente n&atilde;o foi algo pontual.

FOTOS: FRANKLIN ALMEIDA.
DIRE&Ccedil;&Atilde;O DE MODA: MARCIO BANFI.
POR: EDUARDO VIVEIROS.
BELEZA: JO&Atilde;O BOENO (CAPA).
MODELOS: RAPHAELLA TRATSKE (WAY) E J&Uacute;LIA LOPES (MEGA).
STYLING: SAMARA BACCAR E TAINARA WOLLMER.
PRODU&Ccedil;&Atilde;O EXECUTIVA: ALESSANDRA DELLA ROCCA.

Karoline Vitto e Carlos Penna: a collab-fusão entre roupas e joias

Tags

Posts relacionados

Moda

Pérolas: saiba como usá-las em joias e roupas

Moda

Alta-costura: a perfeição e identidade do artesanal

Moda

Kitty Spencer: sobre moda, joias e semelhança com a tia Diana

Posts recomendados

Pop culture

Jennifer Lopez homenageia Donatella Versace e relembra parcerias

Pop culture

Fernanda Montenegro se despede do cinema após 80 anos de carreira

Moda